Academia de Medicina da Bahia Scientia Nobilitat
Tamanho da Fonte
Joaquim Martagão Gesteira
Cadeira: 25
Patrono: Joaquim Martagão Gesteira
Patrono

Nasceu Joaquim Martagão Gesteira em Conceição do Almeida, no recôncavo baiano, em 17 de maio de 1884, filho de Maria Amélia Martagão Gesteira e José Leandro Gesteira. Concluiu o ensino primário em sua terra natal. Veio para Salvador, onde fez o curso secundário no ginásio São Salvador.  O estudante Gesteira era mestiço e, apesar dos preconceitos, muitos frequentes naquela época, continuou se dedicando aos estudos e buscou nunca se abalar com as atitudes preconceituosas que enfrentava.

Em 1902 entrou para a Faculdade de Medicina da Bahia (FAMEB). Foi Interno de Clínica Propedêutica a partir de 19 de dezembro de 1907 até o fim do curso, em 14 de dezembro de 1908. Diplomou-se na Faculdade de Medicina da Bahia, em 1908, 92ª turma, a do 1º Centenário da FMB: 1808-1908. Defendeu a tese inaugural “Etiologia e diagnóstico da septicemia de Bruce”. (GESTEIRA, 1908)

Exerceu a clínica pediátrica e logo buscou também exercer o magistério, pois em 1909, com um ano de formado, tomou posse em 5 de junho como Assistente Efetivo da cadeira de Clínica Pediátrica Cirúrgica e Ortopédica. Em 1910, tornou-se Livre Docente para Clínica Pediátrica Médica, tomando posse em 01 de abril, regendo a cadeira até 1912, quando assumiu, em 06 de novembro desse ano, o cargo de Professor Extraordinário Efetivo de Clínica Médica e Higiene Infantil, após defender a tese “Reação de Schmidt Triboulet – valor diagnóstico nas afecções do lactente”. Dessa forma, foi o primeiro médico na Bahia a oferecer um curso livre na área de Clínica Médica Pediátrica e Higiene Infantil, tendo que lutar para obter um espaço para firmar a escola de Pediatria em nosso estado.

Tornou-se Professor Catedrático de Clínica Pediátrica Médica em 1914, defendendo a tese O exame médico da criança. Semiótica do apparelho respiratório intra-thoraxico. Foi nomeado em 5 de maio e tomando posse no dia 31 do mesmo mês, ficando até 1937, portanto por mais de vinte anos. Nessa função, dedicou-se a coletar dados de óbitos de crianças até um ano, para compreender a causa do alto índice de mortalidade infantil na Bahia. Identificou, sobretudo, problemas higiênicos nas habitações e erros dietéticos, inclusive a substituição do aleitamento materno por leite artificial ou outros alimentos impróprios para o sistema digestiva das crianças:

O abandono de alleitamento materno já nas classes elevadas da sociedade, sob os pretextos fúteis e absurdos, de que a amamentação enfraquece a mulher, fa-la emagrecer ou envelhecer precocemente, já nas classes operarias, obrigadas que são as mães a passar grande parte do dia nas fabricas, no atelier, longe dos seus lactentes, é incontestavelmente o principal desses erros dietéticos e o fator primordial dessa espantosa lethalidade da primeira infância (Joaquim Martagão GESTEIRA, 1917 apud RIBEIRO, 2011)

O médico pode perceber além dos fatores citados acima, constatou também que havia uma má orientação dos colegas, poucos instruídos em puericultura, constatando que seria necessário construir uma formação do pediatra neste campo da medicina preventiva. Em 1918, constatou que 34% dos óbitos em menores de um ano em Salvador eram por doenças gastrointestinais. 

Esteve a serviço do governo de 10 a 29 de outubro de 1917 e, no ano seguinte, representando o governo federal, esteve em Congresso de Pediatria em Montevidéu, Uruguai, de 1º de maio a 19 de junho. Em 1919, foi para a Europa para curso de aperfeiçoamento. Só na segunda metade do século passado, a maioria dos docentes vai optar pelos EUA como o local de realização dos cursos de aperfeiçoamento profissional.

Foi um dos fundadores, em 1923, da Liga Bahiana contra a Mortalidade Infantil, que, na Bahia, “tantos e relevantes serviços tem prestado” (Antônio Loureiro de Souza. Baianos ilustres, 1973, p. 280), sendo atualmente denominada de “Liga Álvaro Bahia contra a Mortalidade Infantil”. O Dr. Álvaro Pontes Bahia é outro fundador da Liga, formado pela FAMEB em 1913, foi também professor da escola mater da medicina brasileira. Em 1929, Prof. Martagão Gesteira representou o país “nas jornadas médicas de Paris”. Em 1937 se afastou para servir ao governo do Rio de Janeiro.

Em 1937, portanto, já famoso e conhecido em todo o país, deixou a FAMEB, pedindo transferência para a Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ), aceitando convite do presidente Getúlio Vargas para trabalhar na capital federal. No Rio de Janeiro teve a tarefa de organizar o Instituto de Puericultura, “trabalho ingente que executou e que se ligaria, indelevelmente, ao seu nome”, conforme palavras de Loureiro Souza no seu Baianos Ilustres (p.280). No exercício das funções públicas dirigiu o Departamento Nacional da Criança, do governo federal, onde ganhou prestígio como administrador. 

Segundo a ficha bibliográfica do Prof. Martagão Gesteira no Arquivo Anselmo Pires de Albuquerque na Fameb-Ufba, a data do seu encantamento no Rio de Janeiro, foi “em 30 de abril de 1954”, embora alguns biógrafos registrem em 20 de junho de 1954.

Pedro Calmon disse sobre esse mestre da Pediatria: “Raros homens terão sido mais úteis aos seus semelhantes, mais benfazejos à sociedade, mais dignos de sua carinhosa estima do que esse grande médico que passou a vida a salvar crianças” (apud SOUZA, 1973, p.279). Um dos seus alunos, Ruy Santos (1978), formado em 1928, em suas memórias de acadêmico de Medicina, disse sobre o seu “mais iluminado” professor: 

Éramos atenciosos às suas aulas, pelo imã do seu talento, duma cultura especializada e de uma didática impressionante. Suas palestras eram, indiscutivelmente, as de maior assistência; a apresentação do doente, então, permitia-nos ver muito mais que o existente em todos os tratados (p.183). Hoje, tanto tempo decorrido, relembro os seus gestos, a sua posição frente à maca em que o doentinho se encontrava. (...) A sua postura. A clareza da frase. A precisão de informes (p.199). 

Outro depoimento de ex-aluno é o de José Silveira, que também destaca o Prof. Joaquim Martagão Gesteira, ‘mestiço claro’, de ‘voz metálica’ e ‘perseguido pela surdez’, não só como um grande médico, mas também como excelente e excepcional didata: “foi ele [Martagão Gesteira] um dos nossos maiores mestres”. E chama atenção para o compromisso social de Martagão em sua área, a Pediatria. “E nem só porque sabia o que ensinava e ensinava muito bem, como igualmente pela sua extraordinária atuação social em favor de crianças abandonadas na Bahia” (SILVEIRA, 1980, p.127).

No Rio de Janeiro, o Instituto de Puericultura, que organizou em 1937, hoje, vinculado a Universidade Federal do Rio de Janeiro, chama-se Instituto de Pediatria e Puericultura Martagão Gesteira. A Bahia não o esqueceu, prestando várias homenagens, como nome de ruas, escolas e, sobretudo, ao denominar um importante complexo de assistência pediátrica com o nome de Hospital Martagão Gesteira, no bairro do Tororó, em Salvador.
O professor Carlos da Silva Lacaz, ao traçar o perfil deste pediatra baiano, de origem humilde e afrodescendente, disse: “Este homem, que nasceu pobre, engrandeceu a sua profissão. Tornando-se merecedor da gratidão de todos os brasileiros”.

Referências
RIBEIRO, Lidiane Monteiro. Filantropia e assistência à saúde da infância na Bahia: a Liga Baiana contra a mortalidade infantil, 1923-1935. Dissertação (Mestrado em História das Ciências e da Saúde) - Fundação Oswaldo Cruz. Casa de Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2011.
SOUZA Antônio Loureiro de. Martagão Gesteira. In: SOUZA Antônio Loureiro de. Baianos ilustres (1564-1925). 2.ed. Bahia: Secretaria da Educação e Cultura-Governo do Estado da Bahia, p. 279-280, 1973.
GESTEIRA, Joaquim Martagão. Etiologia e diagnostico da Septicemia de Bruce. These apresentada à Faculdade de Medicina da Bahia. Bahia: Typ. do Salvador – Cathedral, 1908. 113p.
SANTOS, Ruy. A Faculdade do meu tempo. Memória-2º volume. Brasília: Senado Federal, 1978.
SILVEIRA, José. Vela acesa. Memórias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília, INL, 1980. 321p.
 

Thaise Abdon da Silva.
Acadêmica do Bacharelado Interdisciplinar de Saúde-UFBA

Ronaldo Ribeiro Jacobina.
Titular da Cadeira nº 29 da Academia de Medicina da Bahia.
Professor Titular de Medicina Preventiva e Social – FAMEB-UFBA 

 

Academia de Medicina da Bahia
Praça XV de novembro, s/nº
Terreiro de Jesus, Salvador - Bahia
CEP: 40026-010

Tel.: 71 2107-9666
Editor Responsável: Acadêmico Jorge Luiz Pereira e Silva
2019 - 2024. Academia de Medicina da Bahia. Todos os direitos reservados.
Produzido por: Click Interativo - Agência Digital